quarta-feira, 23 de junho de 2010

Tanto vaga-lume

                Tanto vaga-Lume

                                                                       
Olga Martins

         Só me lembro da correria doida da molecada .Mal voltavam da escola e a noitinha começava a roçar as horas, aparecia lá no final da rua um tremeluzir enlouquecido.Verdadeira constelação .
         Rua sem asfalto.Rua sem modernidade dos postes iluminados. (Nem precisava que o céu vinha nos visitar algumas vezes.)
         Era rua porque se chamava assim , mas lá pra baixo perto do morrão  era um mar de mato.
         Os anjinhos sem asas disparavam  de suas casas-nuvem  carregando potinhos para fazer lampião.
         Estrelinha acendia aqui , piscava lá , mudando de lugar a todo instante como se o próprio céu se movesse .Pegava-se uma estrelinha  e mais outra e outra mais e parecia interminável a multiplicação delas.
         Era um tempo assim à toa , de algazarra luminosa , cheia de planos individuais em que cada um imaginava o que faria com aquele brilho todo. Talvez por uma espécie de compaixão não me lembro do destino das fagulhas vivas capturadas..
         De volta para casa , depois do banho , do prato de comida, da conversa ligeira , enquanto os olhos não se despregavam da novela das oito ,as estrelinhas viraram fogueirinha na memória.

sábado, 5 de junho de 2010

Em junho

A friagem judiava desde o outono, mas era mesmo na época das Festas Juninas que a gente sentia as temperaturas desabarem.Na região do Parque Bristol, colada à Mata do Governo - complexo que abriga ainda hoje  o Jardim Zoológico,o Zoo-Safári e o Jardim Botânico - e sob a umidade vinda da Represa Billings , o frio,como dizia minha avó Olinda não era bolinho!Sabe a famosa garoa?Ela existia e insistia.


Não havia toalha de mesa porque não havia mesa, as pessoas da rua não combinavam nada e nem celebravam os santos do mês.Pelo menos isso nunca evidente,embora uma ou outra colega ensinasse uma simpatia qualquer para saber o nome do futuro namorado, marido...Simpatia ou brincadeira?

Da maneira mais ancestral a molecada maior reunia pedaços de pau e erguia uma pilha ordenada.Logo , feito rastilho de pólvora a notícia se espalhava pelas casas da rua: " vai ter fogueira!"A pilha de madeira ia sendo alimentada pela molecada menor também que saía à cata do que pudesse ser usado.

A tarde de amarela passava para os tons ruivos.De dentro das casas brotavam alguns odores.Nélson trazia o violão e logo era rodeado enquanto desfiava seu repertório de serestas e canções juninas.

Dona Lia aparecia com algumas cocadas,alguém trazia quentão.Aparecia então uma bacia de pipoca aqui alguns pedaços de bolo, até pinhões cozidos que eram partilhados sem a menor cerimônia. Na rua sem asfalto equilibravam-se alguns banquinhos, algumas cadeiras e a fogueira se acendia para aquecer e iluminar a noite que descia sólida, gélida e úmida.

Não tardava e os estalidos de bombinhas me enchiam de medo.Sempre senti muito medo das bombinhas e das brincadeiras com fogo.Com folhas de jornal, a turminha fazia galinhas chocas que subiam faiscantes para em breve se tornarem cinzas e os pacotes de bom-bril desapareciam em luminosas fagulhas que giravam em círculos nas mãos ágeis.

Subiam aos céus o balões de papel de seda.Não eram vistos como vilões ainda e eram celebrados com o famoso: " Cai, cai, balão..." Eu torcia para que não caíssem....Eles bem que podiam levar para os ares as pequenas tristezas dos meus dias, pulverizando a falta de esperança que às vezes batia doído.

Alguns ousavam pular a fogueira e eu não me atrevia a ir além da igreja Assembleia de Deus que ficava próxima à esquina de baixo.Minha mãe ficaria uma fera!

Era um entra e sai das casas e se repetia o alerta " Coloca o gorro, menino";"Menino que brinca com fogo, acorda molhado!"

E quando o movimento ia diminuindo como as labaredas que minguavam na fogueira, assávamos batatas-doces entre as brasas.Assávamos segredos que deveriam morrer ali e desejávamos que a noite fosse infinita para revolvermos as cinzas até que uma fênix despertasse.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Hoje, 3 de junho na Seção Prosa e Verso do jornal A TRIBUNA sob a coordenação do Grupo Oficina Literária de Piracicaba tendo por responsáveis pela página o queridos: Ivana Maria França de Negri e Ludovico da Silva , saiu publicado um texto meu :



RECICRIANDO

Olga Martins

Antes de deitar, às vezes, vasculho a grande sala sem janelas. Nela , esparsas , as ideias. A sala é um grande vão. As ideias , uma grande confusão.

Antes de fechar os olhos , já deitada, faço uma coleta seletiva ... Aqui, ali, acolá, pilhas...montes...

E, quando o sono é uma realidade, parte do que foi separado se torna reciclado. Posso reconhecer nos sonhos as ideias com nova roupagem.



Vale lembrar :

Prêmio Camões 2010

O poeta e dramaturgo Ferreira Gullar, prestes a comemorar 80 anos, recebeu o mais importante prêmio literário da Comunidade de Países de Língua Portuguesa. A escolha foi divulgada pela Ministra da Cultura de Portugal, Gabriela Cavilhas, em cerimônia realizada no Museu Nacional de Arte Amiga em Lisboa. O valor do prêmio é de cem mil euros.