sábado, 31 de dezembro de 2011

A cereja do bolo

Existe um ano novo batendo à porta e mesmo que eu desejasse mantê-la fechada seria inútil ,porque o ano entra pelas frestas e inexoravelmente invade.Também eu não tenho motivos para tentar impedi-lo.Essas areias do calendário foram feitas para isso mesmo para nos fazer avançar na arquitetura de novos anseios e esperanças.Oxalá!
Daqui a algumas horas 2012 será o nome do nosso tempo por  366 dias - ano bissexto,lembra?
Meu amigo Bernardo acabou de me ligar do Rio,das areias - não do tempo, mas da bela Leblon - e me fez uma pergunta inquietante:
- Olga,qual nota você dá para 2011?
Pergunta difícil,não é?Nota absolutamente subjetiva e passível de diferentes perspectivas.
- Analisando que faceta?
- Ah! Sei lá...
Antes que eu ouvisse a continuação de seu pensamento,remoí algumas palavras:
- Do ponto de vista profissional talvez fosse mais fácil de dizer...hummm sociológico,político,econômico - ai, meu Brasil da corrupção...hummmm acho que sete.
- Sete?
- Não foi um ano muito legal não,mas  manteve a média dos últimos tempos...sei lá...(Nota-se a clareza para avaliar)Não foi tão ruim, mas foi morno, sem graça,longe de ser muito bom,longe da excelência.
- Éeee...A gente se viu muito pouco.Esses três pontos que faltam devem ser por causa disso.
- Pensando bem deve ser por isso mesmo.- uma gargalhada escapou sem esforço algum,como sempre acontece quando estamos juntos e passamos o tempo rindo do mundo.
- E você? Daria quanto?
- Uns seis.
- Eu fui mais generosa...
-Achei esse ano uma porcaria.
Do lado de cá da linha não poderia haver nada além de outra gargalhada ,porque conheço as peculiaridades desse amigo e também porque ele descreveu alguns fatos e impressões de seu 2011 que talvez merecessem nota abaixo da média.
- E agora? E para o ano que vem?
- Outra história...talvez a mesma... (Nota-se o meu entusiasmo pelo dia de amanhã)Ando meio cansada de enxugar gelo,isso desanima, Bê!
- Eu sei!
E a conversa tomou um rumo sério,depois descambou de novo quando ele contou a história de um amigo argentino que também está no Rio e que estava louco para ver o ritual de homenagens a Iemanjá.Um argentino de calça rosa e camisa estampada. Kitstch.
Eu tinha nas mãos um potinho com algumas cerejas que havia acabado de lavar.Esta conversa teve gosto de cereja e de gargalhadas.
- Aposto que 2012 vai ser melhor.A gente se vê e então você já começa a pontuá-lo a partir do três.Assim vai ficar mais fácil ter um ano com nota melhor.

Já vai, Bernardo,já vai.Ter amigos que nos liguem mesmo enquanto estão no lugar mais bonito do mundo
e nos façam rir já traz a cereja para o bolo. 

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

De mesa em mesa

Fiquei olhando aqueles meninos e meninas fazendo suas provas trimestrais.Meninos e meninas de sempre,em sua maioria tensos,concentrados;ora mordendo a ponta do lápis,ora com os cotovelos apoiados na mesa e a cabeça apoiada na mão.
Intrigaram-me os pés das mesinhas.Acostumada a vê-los paralelos,caminhei pela sala e a fim de alterar meu ponto de vista e confirmar que eles se distinguiam por traçar um ângulo diferente.Na parte mais próxima ao corpo dos meninos a distância entre os pés era um pouco maior e diminuía gradativamente e formavam um"dez para as duas" invertido.
O tampo das mesas também tinha um desenho diferente.Os cantos da frente foram aparados e arredondados e as laterais acompanhavam o movimento dos pés já descritos.Tampo da mesa,assento e encosto das cadeiras azuis,bem como as ponteiras emborrachadas de cada pé da cadeira e da mesa.Todo o restante cinza colorindo as partes de metal.Asim,plástico azul escuro;metal cinza.
Por um segundo desenhou-se diante de mim uma linha do tempo baseada nas carteiras escolares da minha vida.Na 1ª série,sentava-me sempre com algum colega ao lado em carteiras conjugadas de madeira pesada,cujos assentos moviam-se para cima e para baixo para facilitar nosso acesso.Também era possível erguer o tampão da mesa para guardar os livros e ele possuía ainda uma canaleta para os lápis não deslizarem e também um orifício onde, em outros tempos, se encaixavam os vidros de nanquim.
Quando fui transferida para uma escola municipal, as carteiras eram um pouco diferentes.Desta vez eram individuais,ainda assim eram pesadas e possuíam mesa e assento conectados.Lembro-me claramente das etiquetas metálicas com a abreviatura PMSP (Prefeitura Municipal de São Paulo).
Demorei a me acostumar com as tais cadeiras universitárias.Sentia dificuldade para organizar o material e escrever consultando livros era algo bem desajeitado.
Não tardou até as salas de aula receberem mesinhas separadas das cadeiras em material mais leve e recoberto com fórmica clara - cinza ou creme - e estrutura metálica pintada de preto.
Parece-me que a velocidade com que as coisas se transformaram nas últimas três décadas também chegou ao mobiliário escolar.Temo, no entanto, que não tenham chegado , de fato, à própria educação.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

O PALHAÇO

Fui ao cinema e depois não queria mais sair de lá.Eu não queria que a lona dormisse nem que a luzes se acendessem.
Assisti a todos os créditos finais e a sala ,que já estava com meia dúzia de gatos pingados, se esvaziou de vez.
Terei que ver esse filme de novo e tenho certeza de que minhas retinas não ficarão fatigadas da delicadeza.Converti cada cena, cada olhar,cada sorriso ou lágrima em impressões profundas que certamente ecoarão em mim por muito tempo.
O cinema pode prescindir do espetáculo pirotécnico e dos efeitos especiais para apostar na história do homem e sua eterna busca pelo encontro consigo mesmo, ainda que tudo esteja sempre sob seu próprio nariz - como comumente está e ele não vê. Pode-se falar da beleza sem explorar as curvas siliconadas do corpo feminino para fazê-la explodir no olhar expressivo de uma menininha que perde os dentes de leite.Pode-se falar da solidariedade de bolsos rotos que se unem para suplantar dificuldades conjuntas.Pode-se acreditar na ternura, no simples,na união.Pode-se voltar para casa.
Com um elenco talentosíssimo,bela fotografia e trilha sonora velha conhecida dos ouvintes de rádio nos anos 70 , O Palhaço provoca lágrimas e risos e assim como "o gato toma leite e o rato come queijo", Selton Mello brilha!


A arte é o encontro do homem consigo mesmo,mesmo que seja para se perder logo em seguida e recomeçar a procura.Selton,não deu vontade de sair do cinema ...O palhaço é uma obra de arte.


sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Estressando São Longuinho

Quem o conhece não se espanta. Quem se espanta ainda não ouviu um terço das teorias mais incríveis elaboradas por esse homem. Assim é Gláucio. Cada dia uma novidade e um desfolhar de gargalhadas.
Toca o telefone:
- Você não vem não?
- Daqui a pouco.
- Está ocupado?
- Mais ou menos. Estou estressando São Longuinho.
- Como é?
- Perdi a chave do carro. Fiquei mais de meia hora feito louco procurando. Revirei tudo quanto é lugar. O sangue subindo ...
Risadas do outro lado da linha.
- Escute, você não tem chave reserva ?
- Filho de Deus, se não acho a chave titular como vou saber onde está a reserva?
- Mas e a história de São Longuinho?
- Pois é, fiquei nervoso porque não consegui encontrar. Deixei o serviço para São Longuinho. Ele que se estresse e encontre.
- Vai ficar esperando a chave cair na sua cabeça?
 - Que seja! Enquanto ele se estressa no meu lugar, vou ficar aqui sentadão na boa vendo televisão. Já arranquei o sapato. Vou relaxar.
- Ninguém merece!
Mais tarde toca o telefone na outra casa..
- Achei. Não falei que o santo se virava?
- Onde estava?
- No sofá..





V

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Lições de humildade

      Eu achava muito esquisito o jeito sinuoso com que Renato Russo se movia no palco. Diante dos meus olhos crus era uma caricatura de algum acesso de descontrole muscular.
      Tive que ouvir as sábias palavras de uma amiga diante do meu provável ar de desdém. “É o jeito dele de curtir.”
      Se bem me conheço, devo ter argumentado,questionado.A língua nunca coube na boca e eu não me daria por satisfeita em voltar contrariada para casa.Se isso se aprende ou não; eu não sei, mas isso era tão a cara da minha família,sobretudo de minha mãe.
     O que realmente importa é que a resposta da Elaine ficou cravada em mim. Talvez ela nem se lembre, mas foi uma das maiores lições que recebi acerca de respeitar a diversidade, o outro.Lição que não veio de casa, veio da vida com meus iguais.
   A outra lição veio de um colega do colegial, na época.Magoo,apelidado assim por grossas lentes posteriormente trocadas pelas de contato, não tinha a visão estreita.Eu estudava no Alexandre de Gusmão,no Ipiranga onde funcionava um segmento acadêmico da Escola Técnica Getúlio Vargas, a GV.Magoo era da turma de eletrônica.Havia um rapaz que devia ser de origem bem humilde, trajava-se com extrema simplicidade e exibia uns sapatões que destoavam totalmente da moda new wave.
      Mais uma vez a língua não coube na boca , como se eu não usasse um par de all star verde,(ou seria um chinesinho??)um número maior porque era do meu irmão!!
      “Ai, Magoo,esse cara é muito estranho! Que sapato é esse?? Enfatizei meu incômodo certa manhã.Os sapatos eram feios mesmo,o cara tinha um jeitão estranho, mas o que é que eu tinha a ver com isso?
     A reposta desferida por meu amigo não apresentou alteração enérgica da voz,não soou admoestadora, foi, por assim dizer uma quase constatação benevolente: “Você sabe se ele tem outro para trocar ou se tem dinheiro para comprar outro par?” Engoli em seco. Pior do que os sapatos foi a vergonha que senti.Bem que poderia dormir sem essa...Pensando bem, não.Isso foi necessário para romper os véus de uma arrogância gratuita.
        Durante muito tempo, toda vez que eu lembrava desses dois momentos eu sentia náusea, demorei para me perdoar pela impulsividade, me sentia envergonhada. Eu realmente preciso agradecer meus amigos pelas lições de humildade.

E você?Já passou por alguma situação semelhante?

domingo, 11 de setembro de 2011

10 anos

Demorei para compreender o zumzumzum que circulava entre os alunos.
- O Flávio acabou de ver na Internet que atacaram as Torres Gêmeas.
- Anh?
A primeira vez que as palavras World Trade Center fizeram sentido para mim foi em uma aula de inglês.Devia ser1984 quando a professora Maraiza nos fez pronunciar várias vezes até quase à exaustão a sequência: World Trade Center.A lição do livro In Touch - a beginning american english series falava sobre Nova Iorque e dava destaque às torres que imponentes se destacavam no cenário.
Quando tive a oportunidade de ouvir e ver os noticiários, fiquei tão absolutamente incrédula quanto tantas outras pessoas espalhadas pelo mundo.
Para quem viveu sob as constantes ameaças da guerra fria, o atentado de 11 de setembro pareceu uma sequência de filme bem ao gosto dos prognósticos das películas de décadas antes.Quando o fato passou a ser assimilado como tal,a perplexidade persistiu e persiste até hoje.
A despeito da infinidade de documentários e reportagens sobre o assunto,não consigo captar a verdadeira dimensão do que ocorreu.Não cabe nas minhas contas a proporção de concreto,poeira,ferro e sobretudo de vidas solapadas no evento.
Difícil também compreender o que se passou nesses dez anos.Muitas vidas jovens perdidas em uma guerra mal conduzida; se é que se possa falar que uma guerra conduza a algo que não seja destruição;intolerância,medo,paranoia e tristeza.

Há dez anos fiz os versos abaixo.Ficam os mesmos,por enquanto.





sábado, 10 de setembro de 2011

Meu professor de inglês

O primeiro ano de trabalho em uma nova escola é  muito trabalhoso. Leva-se tempo para adequar materiais à proposta pedagógica e para entrar no ritmo imposto pelo cotidiano escolar.
Em função disso não tem mesmo sobrado tempo para mim e para esse blog de que tanto gosto.
O que isso tem a ver com professor de inglês? Well... voltei à sala de aula como aluna e até mesmo as tarefas que eu deveria cumprir em casa estão meio emboladas.Passo a maior parte do tempo preparando provas, aulas, atividades e corrigindo uma grande quantidade de material.Nos intervalos do dia encaixam-se as obrigações domésticas,maternas e filiais.
Ufa!Sérgio,my teacher,me alfinetou: ...Mas para escrever no Blog você arranja tempo, né?
O pior é que não, professor!Bom que você tenha me lembrado disso, porque em meio a tanta angústia por cumprir tudo com a maior honestidade possível acabei deixando-o de lado.
Esse post ainda seguirá mais um viés relacionado com o professor Sérgio:a indicação (obrigatória) da leitura do livro Of mice and men de John Steinbeck,

Ao ler as dez páginas iniciais,minha memória foi se refrescando e reestruturando o enredo que eu já conhecia.
Sentada no salão de cabeleireiro,sob o ar frio e agradável do ar condicionado, a longa espera foi um presente de sábado.O ruído dos secadores e o falatório acabaram diminuindo e regrediram tanto ao ponto de serem ensacados e absorvidos pelas páginas de papel-jornal da publicação.Embora o vocabulário não fosse completamente dominado por mim, as frases foram deslizando para a construção de imagens muito nítidas na mais particular das telas de cinema.
Resolvi comprar a versão impressa,embora tenha a versão digital.Mesmo conectada às novas tecnologias,sinto uma necessidade(nostalgia?) enorme de manusear os livros, percorrer os olhos pelas linhas,captar a textura do papel,roçá-lo,virar páginas e, quando necessário,umedecer os dedos com saliva como num beijo.
Junto com o livro comprei uma luminária para leitura;eu já havia visto várias,mas não tinha me decidido em adquirir uma.Dessa vez, aproveitei a oferta do site e comprei os dois;livro e luminária.As noites de insônia podem vir que poderei ler sem incomodar o maridão.
O professor Sergio então motivou esse post e pelo que tenho visto,provocará alguns outros.As dicas dele são muito boas, muito boas mesmo!Posso dizer que trazem luz ao contexto.
Por hoje é isso .Leia o livro ou veja o filme,mas não deixe a obra escapar.

sábado, 6 de agosto de 2011

Medo

sábado, 6 de agosto de 2011 0h48

Homem rende família em casa e rouba aparelhos


Um homem simulando estar armado entrou em uma casa no Jardim Elite, ameaçou três pessoas da família e roubou equipamentos eletroeletrônicos e dinheiro. Antes de deixar a casa, o ladrão trancou as vítimas no banheiro e fugiu a pé. Os vizinhos acionaram a Polícia Militar depois de ouvirem os gritos de pedido de socorro.
De acordo com as informações dos policiais militares Araújo e Jameson, que foram acionados pelo Copom (Centro de Operações da Polícia Militar) pelos vizinhos, o homem entrou na casa localizada na rua Teresa Valverde Valério por volta das 13h50 e ameaçou a família, fazendo gestos de estar com uma arma sob as roupas. No momento do roubo, havia três pessoas dentro da residência, dois adultos e um adolescente. Todos foram trancados em um dos quartos da casa enquanto o ladrão subtraía os pertences das vítimas. 



Assim que li essa notícia,minha apreensão, que já anda enorme por estes tempos,espremeu meu coração e me deu uma terrível sensação de medo e indignação.Não nos é mais possível agir com generosidade à porta de nossas casas,conforme aprendemos nas Sagradas Escrituras.Esse mesmo homem,poucos momentos antes havia tocado a campainha da minha residência ,pedindo um prato de comida.Assim que minha colaboradora atendeu à campainha e o rapaz,muito bem arrumado,fez o pedido e levantou a camiseta dizendo não estar armado,ela me chamou à porta da frente.Ele já havia de afastado do portão e estava no limite entre a rua e a calçada.Eu lhe disse que hoje não seria possível ajudar.Diante da negativa, ele agradeceu polidamente e se foi.
Confesso que ando apavorada.Certa vez, aqui mesmo na Rua Maria Tarsia,fui abordada por bandidos ao entrar na minha garagem,por sorte ,levaram o rádio do meu carro e meu celular apenas.O homem, alto e forte afirmava ter pressa porque tinha que chegar a São Paulo e que havia acabado de sair da prisão, beneficiado por algum indulto.
Não é possível viver sob essa lâmina que pende:o terror causado por bandidos crueis que matam banalmente.Pagamos tantos impostos e quando se fala em direitos, os advogados desses bandidos e algumas entidades fazem questão de assegurar os de quem causa os crimes.
Foi-se o tempo dos ladrões de galinhas...o perfil da bandidagem hoje não é mais o reflexo da desigualdade social e nem da falta de uma educação de qualidade.A democratização deste último item,ainda que longe do ideal,assegurou o acesso às escolas, portanto a velha justificativa não cola mais.O avanço das drogas que destroem  famílias e  comunidades tem tido papel significativo na degradação de valores e  nós, trabalhadores e pais de família, precisamos de ajuda do poder público,URGENTEMENTE!!!

domingo, 17 de julho de 2011

Melancolia

Esses dias li : "A vida,essa pérola translúcida..." A frase grudou em mim feito poeira em pele úmida.Sensação estranha de algo poeticamente perfeito e conceitualmente discutível.
E não é mesmo assim que a gente se sente às vezes?
A densidade do peito carregado de emoções fecha as cortinas do coração e a luz que passa é tão grossa e leitosa que chega a entupir as veias e provoca um choro sentido.Ainda assim pulsa.Pulsante é dor e porque pulsa é vida.
Saudade de amigo,de animalzinho de estimação,de namorado,de filho distante,de visita boa.
Se eu pudesse interromper o fluxo das coisas que entristecem...Não posso e tenho que admitir minha natureza melancólica.Quando se aproxima o limiar,faço a transposição dos rios;choro ou faço poesia.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Coreanos?

A chegada dos coreanos a Piracicaba tem gerado muitas expectativas e algumas histórias.Conheci poucos até agora.No entanto, há muitos anos convivo com uma família de taiwaneses,cujos olhinhos puxados sempre os levaram a ser chamados de chineses.Até explicar que são de Taiwan...
Os filhos da família Tsai estudaram no Brasil e pelo tempo que estão aqui já podem ser considerados brasileiros.Até o final do ano deve sair a cidadania deles e isso será justo, afinal são contribuintes e gostam desta terra.
Como eu dizia,os membros da família sempre foram chamados de chineses e agora que já desistiram de explicar sua origem, a chegada dos coreanos reacendeu a questão.
Edna , a filha que antecede o caçula, mora em São Paulo, mas vem a Piracicaba todos os finais de semana para ajudar os pais no santuário taoista que dirigem.Esses dias , Edna ficou adoentada e resolveu recorrer ao pronto socorro de seu plano de saúde aqui mesmo na cidade.Pediu que sua irmã Fabiana a acompanhasse.
Durante o atendimento algo muito curioso ocorreu,antes de examinar a moça , o médico fazia algumas perguntas que Edna respondia em bom português,mas o doutor se dirigia à Fabiana pedindo-lhe para traduzir para a paciente.
Levou algum tempo para que ele percebesse que Fabiana não abria a boca e que era Edna que falava com ele diretamente.
A cena gerou algumas risadas.A justificativa: a recorrente situação de coreanos acompanhados de tradutores.
Imagine só como serão os próximos meses.A família Tsai ainda viverá curiosas situações até que os coreanos se comuniquem em português,língua oficial do país em que eles pretendem se tornar prósperos.

sábado, 2 de julho de 2011

No supermercado

Aproveitei a oportunidade de ser a próxima no caixa.Mesmo não estando com pressa,eu que sou meio acelerada, gosto de ganhar tempo.
Enquanto passava as compras do senhor a minha frente, a  atendente aproveitou a colega de passagem e pediu um copo d'água.Justificou:
- Nossa! Queimei a boca... - passou a língua nos lábios e arrematou o gesto com uma apalpadela antes de completar - ...comendo pastel.
Voltou a passar o produtos pelo leitor ótico. Assim que a colega retornou com o copo de alívio,repetiu:
- Queimei comendo pastel...
- Pastel?
- É,eu sempre como pastel da Maria que fica todas as terças-feiras na Santa Cruz.- falou sem interromper o trabalho.
- Ah! A Maria?Eu já trabalhei para ela, menina!...
A caixa tentou  passar o código de barras de um pacote de linguiça calabresa,mas não conseguiu.O leitor não reconheceu.
- Trabalhei três anos com a Maria do pastel.
- O pastel dela é o melhor!- Esticou a etiqueta e repetiu a ação,ainda assim o registro não ocorreu. - Uma delícia mesmo! 
Virou de um lado,mexeu de outro e nada feito.
- Ela mora perto da minha casa.Todas as sextas-feiras, meu pai pega pastel lá na casa dela . A moça tentou ler o números para digitá-los,mas sem distingui-los, desistiu.
- Você lembra do Juninho,um freguês que pedia sempre o mesmo pastel?Vivia lá na barraquinha com uns amigos?
- Sei!Já fiquei com ele!- Respondeu quase displicentemente. 
- Meu primo!- falou a moça num tom divertido.Tomou mais um gole de água e recorreu então ao mocinho de patins para pesar a linguiça novamente,interrompendo por um segundo o diálogo.
O senhor de óculos a minha frente que até então mantivera-se impassível,acabou deixando um riso escapar.Também eu não pude refrear o riso.Ambos continuávamos ignorados pelas amigas.Assim que voltou a obter a atenção da caixa, remendou:
- Quer dizer, fiquei não.Ele é que vivia insistindo para sair comigo,mas sair mesmo não saí.
- Ele tem um filho.
- Ah,é?
- É...mas já largou a mãe do filho dele.
A operadora já havia terminado de passar as compras e esperava apenas que a linguiça voltasse.As minhas já estavam na esteira e o jeito era mesmo esperar.
A conversa foi interrompida brevemente pela chegada da linguiça desta vez etiquetada.
- Você viu a escala de folgas?
- Vi e detestei!Não achei nada justo.Eu já trabalhei no feriado.
- Eu também,respondeu a colega erguendo a voz.- Vim nos mesmos dias que você!
- Crédito ou débito?
- Débito, respondi, estendendo o cartão do banco.

domingo, 5 de junho de 2011

Tacos soltos


TACOS SOLTOS
                                                                       Olga Martins

            Os tacos, cada um deles tinha um som característico quando se entrava naquele quarto. Era o único quarto da casa, par perfeito para a única sala, único banheiro, única cozinha de uma família de seis pessoas, família que tempos depois se esvaziou.
            A pisadura que se pretendesse silenciosa acabava sempre por denunciar uma presença, uma intenção. Às vezes, escutava-se o esmagar da areia sob aqueles tacos meio ou completamente descolados a esfarelar as palavras presas na garganta.
            Outras vezes, na ligeireza das passadas, terminavam por celebrar entre si com gritos de madeira os ecos das almas. Os velhos tacos sempre denunciavam estados de espírito. Verdades bambas, ira, insegurança, revolta.
            Ao varrê-los podiam-se ouvir as notas de um xilofone desafinado. Mudava de tom aos sábados, dia de faxina grossa.
            Havia quem, sem esperanças de vê-los consertados, desenvolvia táticas de guerra de como atravessar campo inimigo e ir abrigar-se em trincheira acolhedora. Nem sempre funcionavam, entretanto. Desviava-se desse e daquele, procurando firmar os pés naqueles silenciosos.
            O ruído dos tacos do quarto era mais vibrante do que os da sala, talvez o velho tapete azul se dispusesse a sufocá-lo, juntamente com as vozes da televisão.
            O quarto , no entanto , era o lugar mais secreto e eu reinava absoluta naquele bosque de tacos soltos e paredes caiadas. A velha penteadeira, cujos puxadores seriam o delírio de qualquer decorador, um velho guarda-roupas de portas inseguras que insistiam em não se fechar direito com puxadores idênticos aos da penteadeira e com gavetas que às vezes teimavam não fechar..A cama de casal centralizada tinha a eterna companhia dos criados-mudos - mudíssimos! No outro canto uma caminha de solteiro, a minha, a cama da caçula; os outros dormiam na sala, até que fosse feito o outro quarto. O bosque possuía uma veneziana de madeira com verniz envelhecido e descascado. Olhando-se pelo lado de dentro, a mesma cor dos tacos. Por fora a conversa era outra, mas o reino também.
            As flechas do sol entravam pela veneziana. Enquanto a tarde caía e o sol já era quase saudade, meus súditos me alegravam com um balé de devaneios. A poeira, levíssima que era , ascendia, partindo dos tacos iluminados em direção ao outro reino. Assemelhava-se esta dança a um festejo de minúsculas fadas reluzentes. Eu as acompanhava em seus passos com meus dedos, embaralhando-as em seus rodopios. Feixes luminosos que alaranjavam e enchiam de tardes a minha presença. O mundo girava.
 Encastelada na minha solidão infantil, pequena tirana, sonhava e aprendia as regras da manipulação. Era a caçula e tirava vantagens disso com grandes olhos observadores.
            E o mundo era tão grande e ia além da janela do quarto, para além da luz que entrava por ela.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

The Whisperer

Sentado à mesa do restaurante do navio, lorde Montagu aguarda a chegada de Eleanor.Ela ainda está em sua cabine ajeitando os cabelos,finalizando a maquiagem ou trocando os sapatos que talvez tenha julgado insatisfatórios.Seguem para a Índia onde o lorde deverá assumir o comando de uma unidade militar britânica e  ser responsável pela unidade motorizada.
Lorde Montagu não estranha a demora,tamborila na mesa,serve-se de mais um gole do copo de cristal,confere as horas em seu relógio de bolso.Antes que os ponteiros lhe comuniquem algo,um forte impacto lança tudo pelos ares,muitas pessoas perdem os sentidos,outras tantas gritam desesperadas e  ninguém  consegue coordenar os pensamentos 
Era 30 de dezembro de 1915 e em menos de dez minutos o SS Persia desapareceu nas águas tensas do Mediterrâneo.Rompendo o tratado naval que afirmava que aos navios mercantes ou de passageiros deveria ser dada uma chance,um aviso para o desembarque antes do ataque,o submarino alemão U-38 lançou um torpedo implacável e centenas de  vidas se perderam.
O Pérsia e Eleanor jamais chegariam à Índia.Sucumbiram juntamente com parte do séquito do marajá de Kapurthala e jazem no leito frio e escuro do mar entre rubis, safiras e esmeraldas.
O silêncio certa vez sugerido por uma pose de Eleanor ao ser  modelo para o famoso escultor Charles Sykes tornou-se definitivo.Silêncio?
Durante as trinta e seis horas em que esperou ser resgatado, John Walter flutuava entre os destroços do navio e de sua vida.Os pensamentos seguiam feito ondas tumultuadas, escapavam entre os minutos, entre as horas que o relógio de bolso não marcava mais.Aliás,cadê ele?Deixou de existir,seguiu seu destino de náufrago entre  restos de lógica e destruição.Sucumbiu.Como quase sucumbiu o lorde.A água, o sol e o medo rondavam-no como o rondava o espírito da morte.E Eleanor?Sentia que esse capítulo de sua vida também naufragara.Sua face era a face do terror.
Eleanor não era sua esposa , era sua secretária e amante.Era mais, era seu amor.A paixão entre eles era intensa,mas não lícita.Além do fato de  ser um homem casado,ela não pertencia à aristocracia e seu status a colocava em uma condição de inferioridade.Diante de seu título,jamais a jovem de origem espanhola poderia adentrar os salões como esposa.Não naquela época,não sob as garras da Inglaterra vitoriana.
Nesse mesmo período,uma geração de milionários,industriais e nobres se rendia ao luxo e sofisticação dos automóveis Roll-Royce e John Walter nutria uma paixão desmedida por carros.Por este motivo tornara-se editor da revista inglesa The Car Illustrated e proprietário do famoso modelo Silver Ghost.Foi ele o primeiro a dirigir um automóvel nos jardins do House of Parliament e foi dele também a responsabilidade de  apresentar ao rei Edward VII o mundo do automobilismo.
A atmosfera do luxo e da exclusividade era o ar que lorde Montagu respirava,desejou assim uma mascote para seu estimado automóvel,mas não era somente a excentricidade  e a ostentação que o movia,era a paixão, era Eleanor.Seu círculo de amigos recheado de personalidades importantes contava com a presença do famoso escultor Charles Sykes e foi a ele que o lorde solicitou a criação.
Eleanor era ,sem dúvida,a musa .Vestida em um fino tecido esvoaçante posou como uma figura fluida,uma deidade.Colocou o dedo indicador sobre os lábios cerrados,sugerindo silêncio,sugerindo o segredo da relação amorosa entre ela e seu amado.Já que a alta sociedade londrina jamais aceitaria seu romance,ele circularia com um símbolo desse amor.
A estatueta em bronze era soberana ao adornar o capô do carro pessoal de lorde Montagu e apenas um grupo restrito compreendia o significado daquela imagem, The Whisperer...

Se ele pudesse voar nas asas de sua musa com o vento varrendo-lhe a dor,enxugando-lhes as lágrimas...Quando lhe estendem a mão e o resgatam da água,ouve um idioma com o qual não tem afinidade.Tem o olhar assustado ,o corpo gélido e uma triste história cujo ponto final se inscreve no obituário publicado nos jornais londrinos...Eleanor Velasco Thornton.



Eleanor era amiga de Anita Delgado, "protagonista" do livro Paixão Ìndia que estou terminando de ler.Alguns dos fatos citados aparecem no diário pessoal de Anita e a história me encantou.Histórias de amor sempre me encantam. A estatueta criada por Sykes se transformou posteriormente na emblemática figura Spirit of Ecstasy,a dama inclinada com os braços para trás que recebe o vento de frente,símbolo da luxuosíssima Rolls-Royce

“A graceful little goddess, the Spirit of Ecstasy, who has selected road travel as her supreme delight and alighted on the prow of a Rolls-Royce motor car to revel in the freshness of the air and the musical sound of her fluttering draperies.” – Charles Sykes, 1911


terça-feira, 26 de abril de 2011

Menudo

Éramos meninas e meninos do mundo inteiro fascinados com mais um produto da mídia.A bola da vez era um grupo de meninos latinos que cantava e rebolava canções específicas para o público adolescente.Se você tem hoje em torno de 40 anos, deve saber de quem eu falo.Sim, o Menudo.
Os programas de televisão (nem se falava em canais pagos) exploravam ao máximo essa febre.Repetiam incansavelmente as chamadas das apresentações do grupo,seus videoclipes (conceito fora de moda em tempo de youtube,myspace e similares),suas entrevistas e tudo o que pudesse se relacionar ao tal fenômeno.
Corríamos às bancas de jornal para adquirir revistas, jornais,pôsteres,álbuns,figurinhas e todo tipo de material possível que contivesse algum registro capaz de aplacar a febre de fã.Nada muito diferente do que ocorre hoje .A diferença reside apenas nos meios de acesso aos dados que a tecnologia oferece.
Cantávamos os maiores sucessos e sabíamos até mesmo as canções mais obscuras.Era comum também exibirmos as coreografias e o  figurino.
Eu estava no 1º ano colegial e até conseguia imitar a voz do Robi Rosa,o mais expressivo dos meninos até a chegada de Ricky Martin.Uma colega até me dizia: " Só precisa melhorar a pronúncia do inglês." Até hoje não sei por quê.Será mesmo?Nunca consegui perceber isso nitidamente,afinal meu inglês era incipiente mesmo e ela não era melhor do que eu nessa matéria.
Meu irmão namorava minha cunhada naquela época e era comum que houvesse certos encontros entre nossas família.O irmão da Eliana tinha praticamente a minha idade e devia ser mesmo tão bobo quanto eu.Certa vez fomos todos juntos para a praia.Mongaguá?Itanhaém?Peruíbe?Nem me lembro direito, pois as três cidades faziam parte do circuito de visitas à praia que fazíamos habitualmente.Eu e o Edinho, hoje um respeitável pai de família e profissional de destaque , divertíamos a família cantando e dançando " Canta,dança, sem parar...Sobe, desce, como quiser...Sonha,vive como eu...pula,grita....Não se reprima,não se reprima...ooooo". 
Minha irmã ,quase doze anos mais velha do que eu, sempre foi muito fechadona.Não era com ela que eu me abria,pedia um conselho ou partilhava emoções.A essa altura de nossas vidas, ela já era casada e tinha um lindo menininho de cabelos loiros.Não entendi muito bem quando ela um dia me anunciou que tinha dois ingressos para irmos ao show do Menudo no Ibirapuera.Se o termo ficar nas nuvens não tivesse sido interpretado pelo meu intelecto até aquele momento,minhas sensações recobriam exatamente a metáfora.
Eu sabia que da minha mãe não viria nem dinheiro nem companhia para ir a um show desses.
Minha Tata, exatamente assim que todos a conhecem até hoje,me levou.Ficamos a uma centena de quilômetros do palco.Provavelmente um dos piores lugares do ginásio,devo dizer, cenário tristemente agravado por uma miopia horrorosa que mal me impedia distinguir os membros do grupo,mas eu estava lá ouvindo,cantando, dançando e vibrando com toda aquela bobagem juvenil.E tudo passou, como naturalmente tudo passa.
Lendo as notícias na internet hoje, fui surpreendida pela notícia de que Robi anunciou que está com câncer no estômago e já iniciou o tratamento lá no Texas.Depois do fenômeno Menudo, Robi ajudou a produzir e compor alguns sucessos de Ricky.
Revendo alguns vídeos e fotos recordei algumas coisas do período em que ele esteve em destaque na mídia, algumas das quais relatei para vocês.Não renego minha boberite adolescente, pq havia muita verdade nos meus sentimentos ; a mistura da ingenuidade do período em que não somos nem crianças, nem adultos;quando somos o meio do caminho sofrendo os bombardeios hormonais, a pouca compreensão dos mais velhos e quando tudo soa tão dramático. Isso é algo que deve estar acima de qualquer julgamento.
Boa sorte ao sempre talentoso Robi.


sábado, 23 de abril de 2011

El Cid


- Nesse feriado eu vou assistir Os Dez Mandamentos,sossegadinho em casa.Nada de viajar.Minha esposa ainda está se recuperando da cirurgia.
- Aquele antigo com o Charlton Heston?
- Esse mesmo!-Entusiasmou-se.Você conhece?
- Ô! E gosto muito!Aliás gosto muito dos filmes antigos.
Essa declaração soou como notícia alvissareira.Ponto entrelaçado para prosseguir a conversa.
- Eu vi algumas das gravações de El Cid lá em Valência.Antes que eu pudesse fazer qualquer pergunta ele prosseguiu. - Eu saía da escola apressado, pegava o ônibus e descia até a praia onde eles estavam filmando.Eu tinha uns oito anos.
Imediatamente comecei a fazer eu mesma meu próprio filme,minha tela ensolarada  na luminosa distância de um tempo que não vivi.Vi o garotinho apressado de calças curtas, sapato de amarrar e meia batendo nas canelas,camisa branca de gola suada e bolso guardando uma guloseima.Aproximava-se ,encontrando caminho por entre as pernas dos adultos que desejavam ver de perto a italiana Sophia Loren e o expressivo Charlton Heston.
A façanha do garotinho se repetiu por vários dias e seus sapatos deviam levar de volta para casa os grãos da areia histórica,areia de ampulheta , escorrendo pelo calendário da vida e migrando para dentro de mim.
- A primeira exibição do filme foi lá em Valência em tela panorâmica.Todo mundo foi ver.
A conversa precisou ser interrompida,pois era horário de trabalho.Tantas perguntas ficaram no ar...O jeito foi assistir ao filme novamente.Dessa vez no youtube e em Espanhol.Vez por outra querendo enxergar um molequinho de calças curtas invadindo a tela.



Abaixo algumas fotos da locação de filmagem:



Se gostar da ideia de assistir ao filme como fiz,deixo aqui a primeira parte,depois é só seguir a sequência no youtube.



sexta-feira, 22 de abril de 2011

Belo Horizonte e arredores (parte II - o imperador Adriano)

Às vésperas do lançamento de mais um livro,a energia de Drico não poderia estar melhor,mas ao mesmo tempo que parece ser fácil falar sobre ele, tal qual o livro de areia que protagozina um de seus livros,torna-se imensamente difícil falar sobre ele.
A verdade é que meu coração é capaz de ler todas as suas histórias e compreendê-lo de maneira imediata. O problema é que as palavras se misturam com os sopros da vida, com os ventos dos sentimentos e o que se fala é nova duna, atrás de outra.
Para se falar de Adriano é preciso compreender que nunca se poderá falar de Adriano,no máximo poder-se-á falar dos encantos de Adriano.
Antes de seu talento de escritor-poeta-professor, enxergo o menino que precisava dormir todas as tardes,que fazia longas caminhadas,que adorava jogar basquete, handball e que só sabia nadar de costas igualzinho ao personagem Jerry da dupla Tom e Jerry.Eita menino cheio de imaginação!Com ele eu podia brincar que as bolhinhas de ar de dentro da piscina eram o que mesmo, Drico?? Acho que qualquer coisa menos bolhinhas de ar...
E ,se quando eu era criança, achava que a poeira que bailava nos feixes de luz da janela do quarto eram fadas,com meu amigo eu podia imaginar mais.
Fazia muito tempo que a gente não se via, não se tocava.Nossa comunicação ficou restrita aos e-mails e aos telefonemas.Nada mais cruel para quem ama.
Há muito anos,ele me entregou uma folha com um poema do Gonçalves Dias:


Seus OlhosSeus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
De vivo luzir,
Estrelas incertas, que as águas dormentes
Do mar vão ferir;
Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
Têm meiga expressão,
Mais doce que a brisa, - mais doce que o nauta
De noite cantando, - mais doce que a frauta
Quebrando a solidão,
Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
De vivo luzir,
São meigos infantes, gentis, engraçados
Brincando a sorrir.
São meigos infantes, brincando, saltando
Em jogo infantil,(...)

Puxa! Eu adorava o tal poema e ele ali, inteirinho escrito pelas mãos do meu amigo Adriano.Ele que compreendia bem a minha alma inquieta e alvoroçada pela poesia.Ele que também de origem humilde saltou para a vida como os peixes do Rio Piracicaba.
Participamos os três:Eu ,Bernardo e Adriano de momentos marcantes das vidas uns dos outros como se do livro da vida ouvíssemos : " Não sei! Só sei que foi assim..."


No domingo pela manhã,resolvemos visitar Inhotim.Honestamente eu não tinha a menor ideia do que esperar,mas lá fomos nós.Abaixo postei algumas das fotos que tiramos lá.








Tamboril, a maior árvore de Inhotim
À beira de um dos lagos...um doce pelos pensamentos deles.
Essas plantas são tão cheias de possibilidades imaginativas.... Isso não parece um jardim
de polvos ?


As caminhas são compensadas pelo paisagismo.


Adorei essa galeria... Abre-te, Césamo!

É duro não saber onde as coisas começam ou terminam.Se é que começam ou terminam.

Essa galeria realmente impressiona.
Élio posando no banquinho feito de um tronco.


quinta-feira, 21 de abril de 2011

Belo Horizonte e arredores (parte I)

Pegar a estrada que me levou a BH há mais de 15 anos e que depois me trouxe a Piracicaba para desenhar uma trajetória de reencontros me enche de ternura.Ternura,eita palavra difícil na boca do povo de hoje em dia!Apenas uma final de semana é muito pouco para dar conta de atender à necessidade de dividir o tempo que o tempo recobriu de saudade.Contudo, tentamos.
Bernardo e Adriano são duas das pessoas com as quais eu desejo passar minha velhice,sob o risco de nunca,jamais envelhecermos- exceto na casca.As gargalhadas mais espontâneas,a sinceridade crua e muitas vezes dura, o olhar amoroso e profundo, a nudez da alma,a transparência da admiração são alguns dos ingredientes que se entrelaçaram para compor essa música que somos.Música clássica alimentada por Bernardo( hoje um pouco mais tecno),os tambores de Adriano,meu cigano lado que transita do flamenco ao rock.Somos uma diversidade una.Somos e seremos eternos enamorados. 
O tempo judia,inventa a distância e faz questão de passar correndo quando sente inveja da felicidade alheia.
Os poucos momentos que tivemos foram invejáveis mesmo.Até eu senti inveja !

Da enorme janela da sala,vê-se BH, crescendo,crescendo...
Para que os cenários do nosso encontro adquirissem maior mineiridade,passeamos pela Serra do Rola-moça,já ouviu falar?Esse também é o nome de um poema de Mario de Andrade. 

Havia uma chuva se formando em torno de nós e víamos as nuvens carregadas se alastrarem feito imensa praga de gafanhoto.À medida que subíamos a serra,acabamos deixando-as atrás em sua velocidade paciente.Resolvemos assistir de camarote um espetáculo da natureza no Mirante Morro dos Veados.Lugar impressionante!Os olhos demoram para captar a expressão do lugar.
Impressionou-me escutar o vento.Parecia a cavalaria alada arrastando com vigor  a massa de nuvens acorrentada.Os olhos ardiam de prazer com aquela beleza terrível!De arrepiar mesmo!
Ali da beirinha, de frente para a face verde das montanhas curvilíneas e voluptuosas.Conversei com o vento que passava nervoso- talvez acelerado pelas asas do milhares de Pégasos - E vinha atabalhoado,trombando forte contra as costas das montanhas.O ruído alto cambaleava de uma pra outra borda e quando chegava ali onde eu estava, derramava-se em uma energia gélida,varrendo tudo com força.Não era canção era pressa-mensageira...aí vem a chuva!
Caio e Be








O frio intenso e o medo dos raios nos fez devolver as rodas para a estrada.Sinuosa, estreita e intimidadora.
Nosso objetivo na sequência era chegar a um local chamado Verde Folhas (assim mesmo sem concordância).Lugar lindo,muito interessante para um contato com a natureza.Assim que chegamos ao restaurante e eu já começava a preencher o termo de responsabilidade para que o Caio pudesse realizar as atividades de aventura,a chuva chegou.Parecia a chegada da tal cavalaria na companhia de Zeus, cuja presença anunciava lançando raios.Resultado : práticas suspensas para a frustração de Caio e meu alívio,uma vez que um dos raios caíra ali bem perto de nós,perto o suficiente para chamuscar os braços e as costa de uma garotinha que havia acabado de se dirigir para o local de arvorismo.
O jeito foi ficar ali,assistindo a chuva, sentindo a presença do sagrado na beleza da natureza.Não dava vontade mesmo de ir embora, mesmo sabendo que no fundo a chuva não passaria tão já.
Mesmo embaixo das gotas geladas, Élio , Caio e Bernardo resolveram descer para a cachoeira.Na hora achei a ideia a coisa mais infeliz do mundo.O céu muito cinza, a tarde chegando no seu finalmente,lama para todo lado ,uma chuvinha fina e fria e o meu espírito avesso a aventuras...Deixei-os ir à frente.Era uma descida razoável entre pedras e degraus com a feliz ideia de cabos de aço para apoio.Mal comecei a descer no meu ritmo estrategicamente lento e cuidadoso,senti medo.Eu sou mesmo muito medrosa quando se trata de enfrentar a natureza ,seus insetos e suas surpresas,admito.Eu poderia voltar, admitir o medo,ficar esperando no restaurante, no carro me mordendo de curiosidade e vontade,ou eu poderia arrancar as sandálias, enfiar os pés nus na terra melada,encharcar minha roupa, bater o queixo de frio e...
Se é que eu calculei tudo assim tão racionalmente, não tenho a menor noção,pois em fração de segundos, respirei, e larguei as sandálias que escorregavam muito de lado,pedi licença e iniciei a descida com uma coragem desconhecida.Algo intenso, forte e reenergizante tomou conta de mim.Alguns degraus eram altos e senti os músculos das minhas coxas repuxarem.Ao me verem,os meninos me saudaram.Bernardo me deu a mão e transpus o último obstáculo antes de chegar a ela, a Cachoeira das Piabas.Só estávamos nós e os seres invisíveis.
Élio e Be

Eu e Be

Parece noite, não é?? Mas ainda não era.
Essa foto saiu melhor



Você deve ter notado que Adriano ainda não apareceu na história, não é??