segunda-feira, 5 de novembro de 2012


Perna de criança cansa!

Os pés hesitavam alcançar o asfalto enquanto outra baforejada quente de um ônibus transpassava-lhe o coração. Suas mãos pequenas agarravam-se às mãos da mãe.Ou seria o contrário? O fato é que naquela esquina cinza, tudo parecia imensamente agressivo, até os solavancos e puxões da mãe assustavam. Suas perninhas traçavam passos velozes e desacertados em meio a tanta gente desconhecida, mas era preciso correr.
Ela não entendia a velocidade e a mãe burlava seu desejo de estacionar."Daqui a pouco, agora não!" Agora não, vamos , vamos... tudo isso era muito chato, cansativo e amedrontador.O peito simulava um chiado.Só faltava essa! Um começo de crise de bronquite àquela altura . Pensava e trocava passos acelerados.O ponto de ônibus ficava longe demais ...Foi aí que um estrondo  acelerou o passo das pessoas .Sequer deu tempo de olhar para cima e um balde de água desabou do céu.
Antes que se molhasse, sua mãe a puxou para debaixo da marquise onde várias pessoas se amontoaram repentinamente , umas sacando um guarda-chuva torto aqui, outras  resmungando. Bem ali do lado a pastelaria se encheu.Não de fregueses habituais, mas de pedestres aos atropelos. 
Ela respirou profundamente e sentiu desabar o cansaço daquela tarde arrastada e se chateou ao pensar que ainda teriam que pegar o ônibus e enfrentar quase uma hora de viagem.
O estômago deus algumas voltas com aquele cheiro quente e gorduroso que se misturava ao cheiro de poeira e  asfalto molhado. Alguns carros displicentes espirravam a água que se acumulava nas bordas da rua. Vez por outra ouvia-se alguém praguejar por receber aquele jato sujo sobre a roupa. Numa breve troca de olhares com a mãe : " Agora não adianta mais a correria.Quer um pastel?" Pergunta pra macaco se ele quer banana.Claro que queria. 
Pedindo licença para o homem de calças dobradas e sapatos nitidamente maiores que o pé do dono, desviaram de uma poça e de uma goteira grossa. O guarda-chuva se curvou por causa do vento e um gritinho de arrepio escapou da boca da menina. Bastou mais uns com licença e alcançaram o balcão da pastelaria do chinês.O banco era muito alto e a mãe teve que suspendê-la numa operação arriscada em que cabo de guarda-chuva e sacolas cheias acertavam incautos. 
Não tardou e um pastel de queijo fumegante chegou em um pratinho de plástico vermelho.Junto com o pastel, a mãe mandou vir um copo de caldo de cana e também se ajeitou  já assoprando o vapor fumegante que saía da fritura.Havia um ruído intenso e uma agitação frenética dentro e na porta da pastelaria, no entanto aquilo nem incomodava mais, visto que aquela delícia trazia o paraíso para a Terra.
Aos poucos o amontoado de gente foi se dissipando. Uns se arriscavam correndo em direção a novas marquises avançando sempre até um local mais conveniente. Outros dali mesmo conseguiam chegar ao ônibus que esperavam.E assim, de repente como surgiu, a chuva também se foi.
Sua mãe pagou a conta, conferiu as sacolas, agarrou-lhe a mão e decretou: "Agora , vamos embora."
Sabia que ia recomeçar o corre-corre, mas nem ligava mais, apesar da preguicinha boa que quase a fazia levitar.
Cruzaram mais algumas ruas e lá estava ele paradinho na Praça da República. A fila nem era tão grande.Dava para aguentar um pouco mais, talvez até desse para ir sentada. Sua mãe conhecia o motorista, cumprimentou-o.Assim que as portas foram abertas e chegou a vez da menina, ela já sabia o que fazer e escorregou por debaixo da catraca, alcançando rapidinho um assento e guardando outro para a mãe. Assim que a mãe se sentou, a menina encolheu-se junto dela que trazia a roupa úmida, os cabelos curtos molhados e um guarda-chuva teimoso que ainda insistia em pingar.Na arrancada do ônibus que a jogou para cima da mãe,lançou um sorriso que foi correspondido , sorrisos que seriam cúmplices para sempre.



sábado, 3 de novembro de 2012

Il Divo

        Luis Carlos Claro é professor de Física,mas isso é só disfarce porque na verdade ele é o talentoso Dikaprio. Esse artista tem humor saindo pelo poros e emana uma aura de alegria constante.Inquieto por natureza e cheio de graça foi responsável por momentos impagáveis durante o período em que trabalhamos juntos, promovendo entre os alunos as mais animadas empreitadas musicais.
        Foi esse doidinho que numa manhã de outubro me apresentou um quarteto que causaria a maior revolução nos meus batimentos cardíacos nos últimos tempos.Um americano, um espanhol,um francês e um suiço de voz doce compõem um grupo chamado Il Divo.
       Ouvi as canções repetidamente, assisti vídeos com entrevistas, com shows e apresentações por todo o mundo,comprei e li o livro. Sabe como , é?
        Por intermédio deles conheci pessoas muito interessantes, algumas das quais tive a chance de encontrar pessoalmente.Ir ao show em São Paulo em 2009 foi o mais intenso momento e o jeito é esperar que retornem.Enquanto isso, as divas - como são chamadas as fãs - se mobilizam.
          Vou aproveitar o post para divulgar um fã-clube http://www.ildivofeelings.com/blog/

Um vídeo de como tudo começou:




sábado, 29 de setembro de 2012

Visita a Manaus
Tem hora que dá uma agonia não entender a voz metalizada dos anúncios no aeroporto ! Fico catando no ar os fragmentos das palavras.Ao meu lado um senhor colocou fones de ouvido e nem percebeu que todos estão ouvindo os tangos que ele crê ouvir sozinho. Diante de mim um senhor de sapatos bicolores lustrosos . Será que ele vai começar a dançar tango? Se bem que sua figura me recorda mais o dançarino de salsa em seu terno de linho e chapéu panamá.
Não deu em nada. Vira para cá, vira para lá, o homem seguiu seu destino, o senhor dos tangos,desistiu da música e resolveu checar os e-mails, continuo não entendendo nada do que dizem nos alto-falantes e o time do Avaí trança para cá e para lá tentando encontrar o portão de embarque.
Músicos, sim, esses que desfilam são músicos. Alguns carregam instrumentos e mantêm um certo ar de artistas em sua roupas descoladas ,chapéus, bonés, óculos e relógios e tênis  . Menos o cabeludo pra lá dos quarenta, cabelo comprido, barrigudo e de bermuda jeans quase na canela.Eis um homem grande e conhecido. Ah sim! Chorão. Já vi tudo, os caras do Charlie Brown vão invadir a cidade... de Manaus. Eles estão no meu voo.

Nunca tive problemas com viagens de avião, mas agora que estou com o corpo um pouco mais avantajado, qualquer voo que dure mais de 3 horas, evoca em mim o feminino do Hulk na TPM.Coitado do Élio que fica ouvindo meus resmungos, mas até ele concorda que a TAM capricha no aperto, sobretudo quando o passageiro da frente resolve reclinar a poltrona.Fiquei espremida sem conseguir ajeitar "a carga" adequadamente.Aí já viu, né? Até a etiqueta da calcinha , que você nunca imaginou existir, marca presença.


No desembarque fãs enlouquecidos esperavam pelo ídolo no saguão. Foi aquela maluquice de gente querendo tirar fotos,abraçar o cara,enfim era um tal calor humano que se estendeu por toda a atmosfera.Antes fosse, era o calorão de Manaus mesmo! 

Para compensar esse calor, tudo quanto é lugar tem ar condicionado e eu que gosto mesmo de um friozinho,gostei,mas não esperava que essa luta de opostos fosse resgatar uma velha inimiga,minha bronquite. Claro que ela chegou já no final da viagem, mas veio,  fraquinha, carcomida pelo tempo ela não hesitou em chegar e me agarrar como um fantasma do passado.

Fiquei no Tropical Hotel,uma estrutura gigantesca à beira do Rio negro em um bairro chamado Ponta Negra. Os longos corredores que se estendiam pelo complexo tinham portas e guarnições em uma madeira escura.E haja madeira! Meu coração tolinho queria contar as árvores que foram derrubadas para aquela sombria compreensão arquitetônica. Melhor deixar para lá.


Eu, que a principio fui meio relutante com a ideia de ir para a Amazônia , tinha vivido dias de ansiedade e prazer, porque apesar de pamonha - como minha avó costumava achincalhar os covardes - tenho um sangue apaixonado pelas coisas da terra , uma alma que palpita agitada por causa das plantas, das pedras, das águas...- creio que resquício de avó benzedeira, que arrastava as chinelas com um galho de arruda nas mãos e ensinava chás e unguentos.

Estava ali na terra dos Manaós ,tribo que habitava a região à época da colonização .

sábado, 14 de abril de 2012

Gago sim, por que não?


      Cada um de nós traz em sua bagagem pessoal dificuldades a superar ao longo da vida;algumas ficam escondidas  e pertencem apenas ao mundo recôndito do vivente que teme deixar rastros e ser ridicularizado.
       Por outro lado, a gagueira , além de audível ,é visível e infelizmente para a maioria dos gagos, risível.Motivo de chacota,tem gerado a infelicidade , o retraimento  e o desastre na vida pessoal dos portadores dessa marca.
    Quando sua gagueira se tornou insuportável, Miguel moveu mundos para eliminá-la.Procurou pela cura como se procurasse pela própria razão de viver.Todo tipo de simpatias e pajelanças foram tentadas.O jovem enfrentou sua cruzada e o Santo Graal era poder falar sem o embaraço da gagueira.
      Como em todas as viagens de aventura em busca do  objeto do desejo, as desventuras são inevitáveis: guizo de cobra moído, bucho de paca,pássaro preto torrado,tantas luas cheias, tantas luas crescentes, tantas sexta-feiras. Enterra isso, engole aquilo e nada.Nada! Nada de positivo , mas de negativo...
     Certa vez Miguel teve de colocar sob a língua um pedregulho virgem lavado em água corrente.Resultado: hospital.Miguel engoliu o pedregulho.
Contudo, a esperança é uma chama teimosa para quem tem um desejo ardente e Miguel não desistiu.Fez a avó vender um terreno em Capivari para financiar tratamentos que... não deram certo.Chegou a enfrentar 25 horas de ônibus rumo a uma aldeia indígena no Mato Grosso.
         Já contava dezessete anos quando juntou o salário de um mês para consultar um renomado especialista da PUC.Uma semana após a consulta, tempo que aguardou impacientemente e durante o qual uma junta de profissionais discutiu o caso,chegou o diagnóstico: 
           - Culpa!
           - Cu...culpa? Como asss... ssim?
      - Você carrega uma imensa culpa por ter matado seu irmão gêmeo.
          Miguel nasceu bonito , saudável e robusto - tinha mais de quatro quilos.Minutos depois que chegou ao mundo, um sangramento intenso trouxe ao mundo um segundo bebê com menos de dois quilos e que acabou não resistindo.
      - Dou...tor, eu vvvvvi..vviiiiim....ao seu con...sss..sssultório com um ppppproblema e sssaio com dois!
Miguel decidiu conviver com a gagueira do modo mais natural possível.Passou a reconhecer as situações em que ela piorava e aprendeu a contornar as crises.Aceitou conviver com ela.Curou-se da obsessão.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Xingu



Minha mãe tinha uma coleção de fascículos a que eu tinha acesso se fosse cuidadosa.Havia muitas informações e meus olhos de criança não conseguiam abraçá-las.O mundo era muito grande e tinha muitas palavras e ideias que não cabiam em mim. 
As ilustrações ora ajudavam, ora me atordoavam a compreensão do pouco que apreendia,mas ainda sou capaz de sentir o cheiro e a textura do papel com imagens  muito diferentes do que proporcionam os inúmeros pixels dos dias de hoje.
Sempre havia um índio com suas penas e suas armas e ao derredor gravuras menores mostrando detalhes do cotidiano das tribos , de sua forma de vida e habitação. Ainda não se falava em etnias, e elas eram diversas.
Quando a professora pedia um trabalho sobre o dia dos índios eu corria para a coleção da mãe,mas nunca conseguia, de fato, compilar dados.Eu nunca soube organizar tanta diversidade de informação para uma simples homenagem escolar que nunca fez sentido na época.
Certa vez alguém do colégio - e aí eu falo de colegial mesmo - chamou um antropólogo para nos dar uma palestra.Aquele homem revelou a poesia de seu encontro com povos indígenas.Não me lembro de quase nada do que ele falou, exceto sobre os sons da natureza que os homens tentavam recriar com suas "flautas".O impacto de sua palestra foi muito marcante.Tanto que, naquela época , se eu tivesse tido chance, teria embarcado em um desses projetos para a floresta.
Depois que virei gente grande, assisti a uma outra palestra e conheci Daniel Munduruku e o olhar do outro lado da história.Também me foi apresentado o livro A terra dos mil povos de Kaká Werá Jecupe ...
Hoje fui assistir ao filme Xingu:

Saí do cinema com as cordas do coração frouxas.Lembranças do tempo de menina, ideais que um dia habitaram meus desejos... A voz do Orlando Vilas-Boas (de verdade) sendo acordada de dentro de algum espaço da minha memória de criaturinha dos anos setenta... Páscoa, transformação... Será... será?
Em junho farei uma viagem à Amazônia.Não sei absolutamente nada sobre a programação. Relutei muito em acompanhar o marido, que é quem sonha com essa viagem há anos , porém , como nada acontece ao acaso, essa pode ser a oportunidade para reencontrar algumas das raízes da minha identidade brasileira,para reencontrar a paixão idealista que me escapou em algum lugar e quem sabe me reencontrar.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

As balas carameladas

Quando a boca toca a camada lisa e brilhante da bala dourada, leva um certo tempo até que os dentes encontrem o ângulo correto para a mordida. O que vem a seguir é luz.
O doce coco se esparrama e baila pelo salão da boca feito Cinderela com seu príncipe encantado.
Estas belezinhas antigas e tão brasileiras parecem gotas de ouro que caíram do Olimpo.Lágrimas de Afrodite? Suor de Apolo? Fagulha do trono de Zeus? Divinas gotas , decerto!
Ana Clara clareou minha semana por se lembrar de mim nos seus momentos de diversão com sua família.
Ana Clara clareou minhas sensações e meu coração com gotículas doces e preciosas.E ela nem sabia o quanto eu amo essas balas!

sábado, 24 de março de 2012

O coração da casa

A bomba puxava a água do poço  e enchia a caixa que ficava sobre o telhado. O som era alto e ritmado e rasgava as horas do começo da semana. Essa foi minha primeira poesia. Brotava das linhas da realidade cotidiana com cheiro e som de coisa comum.
O poço  ficava nos fundos da casa e era a minha fantasia cheia de encantos e temores. Ninguém compreendia o tamanho da angústia e prazer que me inebriavam quando vinha a ameaça : Cuidado! Tem jacaré lá dentro! Se você chegar  na beiradinha, eles vão pegar você. Que ameaça desesperadoramente atraente! Eu sentia as entranhas estremecerem de pavor e de curiosidade. Quase perdia os sentidos quando a tampa – sempre muito protegida para evitar acidentes – era removida. Um torpor me tomava quando minhas narinas eram invadidas pelo cheiro de tijolos úmidos. Minha mãe permitia , muito raramente, e sempre com alguém me segurando , que eu me debruçasse sobre a estrutura de cimento e olhasse dentro daquela abertura mágica. Nunca vi jacaré algum, mas nunca duvidei de que eles estivessem ali.
Devo ter sonhado com os monstros de dentes afiados que eu costumava olhar intrigada por intermináveis minutos todas as vezes que ia ao zoológico e certamente devo ter molhado a cama algumas vezes.
Enquanto a sinfonia da bomba pulsava, a casa ficava viva com aquele coração engraxado. A porta da cozinha dava bem em frente à estrutura de cimento que circundava a boca do poço. Era ali que eu brincava. Tudo era cimentado, aquele cimento queimado que deixava o contrapiso lisinho. Depois de varrido e lavado eu podia sentar, deitar e rolar. A vida era cheia de ruídos e cheiros que criavam a sensação de pertencimento que nunca mais senti depois de crescida.
Havia as conversas à mesa da cozinha em torno do café e proibidas para crianças, no caso, eu. A voz da minha mãe em cochichos e comentários que eu espichava a orelha para entender, só para ter a certeza de que não eram sobre mim, sobre minhas artes e possíveis castigos. Havia também os bate-bocas entre minha mãe e meu pai , certamente havia, mas  talvez por negação não me lembro de nenhum . Talvez eu trocasse as vozes que ameaçavam minha inocência infantil pelo som da bomba, pelo coração da casa mantendo viva a família.
Mas um dia a SABESP trouxe esgoto e água encanada para a nossa rua e calou a bomba. O coração da família parou de bater e meu pai saiu pelo portão carregando uma mala.

A boneca de porcelana

A Boneca de Porcelana
Cecília Coutinho

Um dia, comprando um presente para minha filha, eu entrei em uma loja e percebi uma boneca antiga de porcelana igual a que por muitos tempo fez parte da minha infância. De repente fui parar anos atrás. Era como se estivesse vivendo meus sete anos novamente.
A boneca era inteira de porcelana, pezinhos com todos os dedinhos e os olhos azuis como o céu, a boquinha rosa clara brilhante e os cabelos marrons como a madeira polida da minha penteadeira onde ela ficava. A boneca era muito especial porque eu a tinha ganhado da minha tia ,que era muito querida por todos, mas que infelizmente hoje não está mais aqui conosco.
A boneca foi muito importante para mim. Na minha infância eu conversava com ela quase todos os dias e achava que ela sempre me entendia. Será não me entendia mesmo?
Um dia, quando  tinha oito anos , eu estava fazendo um lanche e ouvi um barulho vindo  do meu quarto. A minha irmãzinha tinha quebrado a minha boneca. Não pude acreditar. Foi tanta malvadeza que eu chorei. Eu nunca pensei que uma garotinha de seis anos fosse capaz de fazer isso comigo afinal eu nunca fiz nada de mal para ela. Até tinha dividido todos os meus brinquedos com a minha irmã, menos a minha boneca de porcelana.  
Mas isso não ia ficar assim. Quando a minha mãe chegou e me viu chorando, perguntou assustada, tentando entender o que tinha acontecido e eu disse a ela que minha irmã tinha quebrado minha boneca de porcelana. Fiquei vermelha de raiva quando minha irmã disse que tinha sido  sem querer, que a boneca cai da sua mão e se espatifou no chão. O fato de ter sido um acidente não se justificava e  eu expliquei para minha mãe que eu já a havia proibido de brincar com a boneca. Por causa disso minha irmã ficou de castigo.
Hoje eu entendo que tenha caído sem querer.
De qualquer forma eu estava tão feliz de ter encontrado uma boneca igual àquela que resolvi comprá-la  para minha filha e ela adorou.

Texto de aluna

sexta-feira, 2 de março de 2012

Flores brancas para Evandro

Comprei pequenas rosas brancas.Elas haviam acabado de chegar no mercado e acho que fui a primeira pessoa a ser atraída por elas.Um buquê delicado,sem excessos,cheio de botões entalhados com a perfeição que apenas a mãe-natureza é capaz de produzir.Dispus galho por galho no vaso de murano vermelho e acrescentei água bem fria.Enquanto o nível do líquido fresco se elevava,meu pensamento ascendia feito fumaça de incenso e não hesitei em carinhosamente afirmar que elas eram dedicadas ao Evandro.Uma conexão sorridente entre meu coração saudoso e esse menino bonito que há três anos - amanhã fará exatamente três anos - precisou encerrar sua jornada aqui neste planeta se estabeleceu.Sem palavras,sem lógica,apenas o batimento cardíaco ligeiramente acelerado e o gosto de uma saudade sem amargor.As rosas sorriram também e aqueceram o momento.
Paulinho da viola, sambista e compositor costuma falar que o tempo dele é o presente,que ele não vive no passado,mas que o passado habita nele.Não encontro nenhuma definição que esbarre nessa ideia ou que seja capaz de ,sem sentimentalismo barato,expressar essa imensidade quase oceânica de sensações.De fato, não me lembro do que já passou com a agonia de quem gostaria de puxar a linha do tempo, enovelá-la para fiá-la do ponto que desejar.Eu me lembro das pessoas, dos lugares,das emoções, porque elas estão exatamente aqui, constitutivas que são do enredamento exato que me teceu.
As flores para o Evandro não são para chorar a saudade - e ela existe - , são , de fato, para agradecer à pessoa que tanto amei - e amo - por sua presença em mim.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Se a vida te der um limão...


Adoro minha tia Fátima,mas as visitas à casa dela são sempre muito espaçadas e os fatores distância e tempo são os principais responsáveis.
Domingo passado ,pouco depois de ter começado o dia, estabeleci o propósito de almoçar com ela.150 quilômetros após estávamos colocando as novidades em dia e haja assunto.
Conheci Hanna e Aisha , as novas meninas moradoras naquela casa só de mulheres.As duas são dois filhotes da raça pitbull que, apesar de me deixarem um tanto aflita, são mansas e lindas.
No quintal da casa da minha tia tem acerola,araçá,rosas,uma pequena horta suspensa e mais um tantão de plantas das mais variadas.Confesso que é uma festa para os sentidos.Há anos formou-se uma curiosa colmeia de abelhas sem ferrão em um xaxim onde havia uma bela samambaia.A samambaia se foi,mas a colmeia permanece.
Tia Fátima sempre acreditou em muitas coisas,agora tem espalhadas pela casa referências do feng shui.Dividindo a sala de estar do espaço reservado para a mesa de jantar há uma viga aparente e sob ela duas flautas de bambu pendentes.Ela insiste em afirmar que a viga bloqueia  a energia e as flautas a equilibram.Acreditando ou não,poucas coisas são mais prazerosas do que ouvi-la explicar.
A vida não tem sido nada fácil para ela nem para suas duas filhas e a neta.Contudo,em meio a tantas adversidades que as assaltam,elas estão sempre cercadas de esperança.Querem sempre aprender algo novo,inventam formas para ocupar o tempo ocioso e o que produzem acaba se tornando uma renda extra e uma incrível maneira de manter relações sociais.
Clichê ou não, os limões viram limonada.E falando em limões.Antes de voltar para casa, tia Fátima me perguntou: " Você gosta de limão siciliano?" 
Minutos depois, Jéssica voltou com uma sacola com meia dúzia de limões gigantescos,impressionantemente perfumados e luminosos.Na volta para casa o vento invadia o carro e espalhava o sol e o odor dos limões e há como há tempos não ocorria, senti a alegria da infância.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Eu, Cronos e a linha do tempo

A sincronicidade é uma experiência arrebatadora.Ela nos impregna de sensações que extrapolam o cotidiano e suas marcas avançam sono adentro.
Hoje eu queria saber mais sobre Cronos, o deus da mitologia grega,senhor do tempo.Vasculhei algumas coisas na internet e me dei por satisfeita com informações singelas que de algum modo serviriam justamente para o contexto da aula que eu havia programado.Horas depois,acompanhando a publicação de algumas pessoas no twitter,cheguei a esse vídeo incrível.INCRÍVEL!

No fluir e confluir das imagens coreografadas com tamanha delicadeza, vi-me afundar e contorcer nas possibilidades e impossibilidades tecidas pelo destino.Destino?Ele existe?
Tortuosas linhas traçam as areias da ampulheta que Cronos carrega e eu vou tentando escrever nelas,escrever com elas.Sofro uma espécie de analfabetismo avassalador.Viro e desviro a página,mas a areia que se foi,se foi e não retorna.Sinto pressa,mas a pressa me atrasa.
Vazam a areia, a pressa e as lágrimas.Se ao menos o coração não fosse um buraco tão amplo!!